LostBrasil :: Exibir tópico - Livro policial entra na lista dos mais vendidos

vivizoka

Alguns anos antes do meio do caminho de sua vida, Dante Alighieri se viu imbuído em resolver um mistério menos transcendental do que os que lhe eram habituais. Ainda não chegara a hora de atravessar o primeiro, o segundo ou o quinto dos Infernos, que dirá o Purgatório e o Paraíso. Mas fora assassinado um grande artista de Florença e cabia a ele, prior da cidade naquele ano de 1.300, desvendar as tramas e os dramas que o crime escondia.

Não, não se trata da descoberta de uma empoeirada e antiga ata policial, tampouco das conclusões de algum novo e polêmico biógrafo. É ficção, mesmo, mais especificamente a que parte da profícua mente do escritor italiano Giulio Leoni, autor de "Os Crimes do Mosaico", o primeiro, de quatro romances que tomam o sumo poeta italiano como detetive a chegar às livrarias brasileiras.

A repercussão que o livro tem obtido, tornando-se best-seller na Itália e tendo seus direitos vendidos a 28 países, reflete o sucesso comumente alcançado pelos livros policiais. E um pacote deles está sendo lançado neste mês no Brasil, reunindo autores como o consagrado espanhol Manuel Vázquez Montalbán e o norte-americano John Dunning.

Voltando a Leoni, será Dante o investigador do crime, a percorrer infectos porões quinquilhados de cadáveres --se não de corpos vivos ainda mais miseráveis--, a freqüentar botecos e debater com sábios embebedados, a engalfinhar-se com um intransigente cardeal e ver-se a ponto de golpeá-lo. Sim, Dante encarnado, ossificado e todo cheio de palavras um tanto mais agressivas e vis do que as que escreveria mais tarde.

Um Dante inteligente e justo, isso a narrativa nos concede, mas ao mesmo tempo arrogante, elitista e por vezes até cruel. Ao longo do romance, não são raros os maus-tratos a que o personagem submete os que julga seus inferiores. O inevitável caminho da ficção, a distanciar-se a cada linha da realidade? Ou teria sido Dante esse homem pouco apreciável?

"Dante era uma personalidade complexa e contraditória. Sua vida inteira foi cheia de elementos que parecem em conflito com a imagem típica do poeta: foi um valente guerreiro, o organizador de uma insurreição armada contra o governo de sua cidade, um amante luxurioso, o conselheiro de um tirano", explica Leoni.

E completa: "Dante foi um grande conhecedor do mal: sua "Divina Comédia" é um magnífico ensaio sobre a psicopatologia criminal, em que uma estrutura aristotélica é enriquecida pela fantasia e pela intuição do poeta. Acrescente-se a isso um conhecimento profundo da natureza humana e se terá todas as qualidades de um bom detetive fictício".

Aí está, didática e literal, a razão para conceder ao nunca esquecido poeta a responsabilidade de entender e promover justiça à morte de Ambrogio, o mestre artesão responsável por construir o mosaico da igreja que serviria à universidade local. À trama, não faltarão elites conspiratórias e intrigas da política florentina, permeada pela disputa entre o poder papal e a família imperial.

Algumas fórmulas comuns à tão em voga literatura policial? Clichês que se repetem livro a livro e que justificam o sucesso que obtêm? "Fórmulas existem em toda literatura: a simples possibilidade de dividi-la em gêneros se baseia na existência delas", defende-se Leoni. "Mas penso que, nos últimos tempos, o romance policial tem experimentado uma evolução. O clássico esquema crime-investigação-solução persiste, mas há variações modernas."

Transportar o clássico às brutalidades do crime há de ser, sem dúvida, uma delas.

Fonte: Folha Online